Por cerca de 2,5 milhões de anos, os humanos se alimentaram coletando plantas silvestres e caçando animais selvagens, que viviam e procriavam sem nenhuma intervenção. Esses grupos de caçadores e coletores já possuíam uma considerável bagagem cultural, que permitia identificar plantas e frutos nocivos ou venenosos, e selecionar os animais para caça. Além disso, desenvolveram crenças que ofereciam explicações para fenômenos da natureza e da fertilidade.
Pensar em como tudo foi criado, é uma das coisas que mais intriga a mente das pessoas. Existem algumas crenças de vários povos e religiões, sobre o surgimento da agricultura.
A deusa protetora da agricultura
Ceres, na mitologia romana, equivalente à deusa grega Deméter, foi uma deusa matriarcal, associada aos poderes da terra. Deusa da fertilidade, protetora da agricultura, da colheita e dos grãos, ela foi relacionada à capacidade de nutrição e geração.
Dizem que ela revelou à humanidade os segredos da agricultura e as artes de: arar o solo, plantar e colher. Ela teria ainda ensinado às mulheres como moer trigo e fazer pão.
Segundo a mitologia, Ceres era mãe de Prosérpina, na mitologia grega conhecida como Perséfone. Quando Perséfone foi raptada pelo deus dos mundos inferiores, Ceres ficou enfurecida e ordenou que a terra secasse e recusou-se a devolver-lhe a abundância. O mundo estava condenado a perecer por falta de alimento.
Os deuses do Olimpo interviram para evitar a fome dos homens e exigiram a libertação de Perséfone. Porém ela havia comido um grão de romã no Hades e por esse motivo se viu obrigada a voltar sempre para o seu raptor.
Ela então viveria com sua mãe durante nove meses do ano e deveria retornar para o seu raptor nos três outros meses. Enquanto estava com sua filha no Olimpo, Ceres permitia que os grãos germinassem e crescessem, criando a primavera e o verão. Quando sua filha ia embora, a tristeza de Ceres se via nas folhas que caiam no outono e no frio do inverno.
A evolução da agricultura
Os historiadores apontam que, enquanto nômades, a humanidade vivia numa economia de depredação, ou seja, retirava-se de uma região tudo o que era possível e, uma vez esgotados os recursos, partiam para outras áreas.
Há cerca de doze mil anos, a humanidade passou a dedicar a tarefa de domesticar plantas e animais.
Descobrir que ao separar a semente de uma planta, enterrá-la e cuidar de sua germinação se produzia uma nova planta, e que esta poderia gerar muitos frutos e sementes da mesma espécie foi, sem dúvida, a descoberta mais importante da humanidade para a garantia da continuidade de sua existência coletiva.
Com a agricultura as pessoas passaram a ter uma fonte estável de alimento, o que contribuiu para que eles se fixassem em aldeias, onde o solo era fértil e propício para o pastoreio e para o plantio, como as margens dos rios, por exemplo. De nômades, passamos a sedentários, e de uma economia de depredação, passamos à uma economia de produção dos alimentos. Assim, fundamentamos a base das primeiras civilizações.
Enquanto uns se dedicavam exclusivamente ao cultivo, outros atores sociais começam a surgir, como os comerciantes que trocam o excedente agrícola por outros produtos, os artesãos que eram responsáveis por implementos para a agricultura como o arado, além dos responsáveis pelo transporte de produtos. Com isso, muitos trabalhadores envolvidos com as atividades artesanais e comerciais abandonaram a agricultura. Os que permaneceram nos campos produziam, agora, não só para a subsistência de sua família, como também para garantir a sobrevivência da coletividade.
Foi a transformação das comunidades de aldeias agrícolas autossuficientes em centros urbanos, dependentes da produção agrícola dos campos. Nesse período, o fogo e o uso de algumas ferramentas, passaram a fazer parte do cotidiano dos aglomerados urbanos, que deram origem às cidades.
Na história da agricultura, há um período divisor de águas na maneira das sociedades humanas lidarem com a produção de alimentos. Um momento em que se forjava não só as bases tecnológicas do mundo moderno e seus conhecimentos, mas também uma nova maneira de conhecer e se relacionar com o mundo.
O desenvolvimento da manufatura (que mais adiante culminou no surgimento da indústria) dependia de mão-de-obra, que era escassa nas tímidas aglomerações urbanas. No entanto, o volume de trabalhadores que produzia a quase totalidade de seus alimentos, passou a ser gradativamente afastado desta relação direta com sua produção. Esse fato trouxe enfaticamente uma fratura metabólica entre sociedade e natureza. A partir daí, o Antropoceno apresenta seus primeiros sinais como a era geológica marcada pela ação humana. Nesse período, nos colocamos como seres superiores à natureza, sem nos darmos conta de que não a dominamos, mas somos parte dela.
Os processos de manufatura e industrialização foram cruciais para a tal fratura metabólica entre homem e natureza, e ainda contribuíram na conformação do mundo moderno e na desvalorização de saberes e fazeres de sistemas produtivos tradicionais. Nos acostumamos a terceirizar tudo e a sistematizar as mais simples tarefas, como descascar uma fruta.
É o processo de industrialização da vida.
Mas o mundo não é uma máquina. O mundo é um organismo.
E por que a humanidade deve continuar a plantar
Estamos em um momento oportuno de busca por uma relação mais amistosa com o ambiente, um olhar integral, estamos percebendo as interconexões entre os sistemas naturais nos encaminhando para a mudança de percepção do mundo em que vivemos.
Ana Maria Primavesi disse que “a natureza com seus caprichos e mistérios, condensa em pequenas coisas o poder de dirigir as grandes, nas sutis a potência de dominar as mais grosseiras, nas coisas simples a capacidade de reger as complexas.”
A regeneração deve partir de nós, uma regeneração interna, para a criação de uma cultura regenerativa. É preciso abandonar a ideia de que controlamos a natureza, como seres inteligentes, e perceber que somos apenas mais um elemento de um sistema natural inteligente.
O verdadeiro potencial de mudança está nos pequenos gestos cotidianos, como consumir frutas, verduras e legumes da época, conhecer a cadeia de produção, dar preferência ao pequeno produtor, e ao produtor local.
A produção de alimentos é um gesto afetivo.
Em cada vegetal no prato, há um desmedido esforço e incontáveis variáveis para que esse alimento pudesse ser concebido.
Devemos nos portar como agentes regeneradores, na esperança de retomar os prazeres simples da vida, e de uma natureza que não sofre de ansiedade, e que detém uma sabedoria não racional, da capacidade de esperar até que as coisas estejam maduras para agir.
Para muitos, plantar é um resgate de saberes que se perderam com o tempo. Compartilhe com a gente nos comentários suas lembranças. Você se lembra da primeira vez em que comeu o que plantou?
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